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quarta-feira, 28 de março de 2012

A GUANTÂNAMO BRASILEIRA

A GUANTÂNAMO BRASILEIRA

Carta de presos na Penitenciária de Itaí/SP, a qual abriga mais de 1.100 presos de 74 nacionalidades.


Nós, presos estrangeiros detidos na Penitenciária de Itaí, São Paulo, Brasil, dirigimos respeitosamente a vocês, por meio desta, um pedido de ajuda para denunciar e remediar a nossa situação nesta prisão. Os mais de 1100 presos estrangeiros, de 74 países, que aqui estamos, denunciamos as péssimas condições de vida neste lugar, as arbitrariedades cometidas pelos negligentes administradores desta prisão, assim como a aparente xenofobia da autoridade judiciária, que decide sobre nossos processos de execução penal.
Estamos todos condenados, também, a sermos discriminados por sermos estrangeiros. Desde a chegada de novo juiz à Segunda Vara de Execuções Criminais da comarca de Avaré, nenhum preso conseguiu mais o benefício da progressão de regime e nem a liberdade condicional. As poucas liberdades acontecidas foram por cumprimento de pena, quer dizer, quando o prisioneiro cumpriu a totalidade da sua condenação. Atitude contrária à decisão do Supremo Tribunal Federal, que decidiu pelo direito à progressão de regime de todo condenado no Brasil, sem distinção de raça, sexo ou nacionalidade. Muitos de nós já ultrapassamos o tempo requerido para obter o benefício da progressão para o regime semi-aberto e continuamos no regime fechado ilegalmente, por decisão da autoridade, violando assim o princípio da igualdade perante a lei. A autoridade tampouco concede aos que já estão há tempos no regime mais brando, as saídas temporárias às quais têm direito, como as que são concedidas aos presos brasileiros que cumprem pena junto com os estrangeiros na colônia de semi-aberto desta penitenciária.
O tratamento dentro do recinto segue o mesmo caminho de discriminação e xenofobia: agora, quando da primeira visita de alguma pessoa que não seja familiar de primeiro ou segundo grau, como amásias, esposas, amigos e amigas, a diretoria exige, além da documentação de rotina, uma entrevista prévia do visitante com a assistente social do presídio, durante a semana e agendada com antecipação, para que esta funcionária decida se autoriza ou não a entrada desta pessoa na visita. Afetando o direito à visita que possuímos segundo a lei, dificultando ainda mais, já que a maioria das nossas visitas provém de outros países e, por economia e tempo disponível, não podem vir com tanta antecipação para poder entrevistar-se com esta funcionária, e com o risco de não ser permitida sua entrada. Uma medida injusta e injustificada.
Outra regra implantada ataca diretamente o direito à leitura, cultura e pensamento: restringiram a entrada e a posse de livros e revistas e, quando as encontram dentro das celas em maior número que dois ou três por pessoa, são apreendidos. O mesmo acontecendo quando acham alguma imagem erótica. Estas são destruídas ou apreendidas. Uma regra moralista ultrapassada, retrógrada, como castigo e repressão.
Denunciamos ainda as deficiências no atendimento de saúde e a falta de remédios.
Também denunciamos as deficiências no atendimento judiciário. Dificilmente conseguimos uma audiência com o advogado público, somente com estagiários de Direito, que nunca sabem nos informar satisfatoriamente sobre os nossos processos. Ademais, esse setor tão importante da prisão, não possui um computador operando para imprimir as informações da Vara de Execuções Criminais.
A parte de alimentação é muito precária. Há cinco meses estão reformando a cozinha. A nossa alimentação está sendo preparada num espaço provisório na marcenaria que está infestado de ratos. Sempre há presos com disenteria e problemas de intoxicação alimentar.
Tampouco é respeitado o direito ao trabalho remunerado. A maioria dos presos está desempregada devido à falta de possibilidades e empresas aqui. Através do trabalho o preso pode se manter e ajudar a sua família, e também reduzir seu tempo de prisão com a remissão de pena por dia trabalhado.
Para completar, aconteceram várias tentativas de suicídio de presos. A prisão está superlotada e a cada dia mais opressiva, com uma população estrangeira que é, sem dúvida, a mais pacífica e menos problemática do Brasil.
Os administradores deste lugar estão cheios de ódio xenófobo e inventam todo dia novas medidas opressivas e injustificadas contra nós, para nos punir ainda mais. Já anunciaram novas regras restritivas para os próximos dias.
Agradecemos todo e qualquer apoio solidário para melhorar esta tensa situação. Uma possibilidade seria o traslado de todos os prisioneiros estrangeiros para algum presídio na capital paulista, que significaria benefício para as nossas visitas familiares, de advogados e dos nossos representantes consulares, que assim poderiam cuidar melhor de que se respeitem os nossos direitos legais que hoje estão sendo desrespeitados impunemente.

Sem mais.

PRESOS ESTRANGEIROS DA PENITENCIÁRIA DE ITAÍ

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